Análise da decisão da ERC sobre o concurso para o 5º canal

Estive a analisar a deliberação da ERC que chumbou as propostas de candidatura da ZON II e da Telecinco ao 5º canal. Além dos documentos emitidos pela Entidade Reguladora, pude ler também o recurso apresentado pela Telecinco, que foi disponibilizado online. Infelizmente a Zon não disponibilizou a sua argumentação.

Antes de entrar nas minhas observações, quero deixar claro o respeito total à plena capacidade da Entidade Reguladora para a Comunicação Social, um importante órgão da democracia portuguesa, que cumpre suas funções com base em um estatuto devidamente aprovado pela Lei nº 53/2005, de 8 de Novembro. Mas cabe ressaltar que o exercício da crítica é também pertinente ao sistema democrático.

Segue, então, a minha análise a respeito de algumas particularidades do referido concurso:

  • A ERC encomendou relatórios a respeito das propostas apresentadas pela Zon II e pela Telecinco, ao Centro de Estudos de Gestão Empresarial da Universidade Nova de Lisboa (CEGE-UNL), ao Instituto de Engenharia de Sistemas e Computadores do Porto (INESC) e ao consultor de média, Luís Pinto Enes. A Lei faculta à ERC esse direito que, não estando previsto como uma fase de procedimento, é considerado facultativo e não vinculativo. No entanto, em suas deliberações, a ERC deixou claro que o peso dos relatórios foram praticamente decisivos na decisão de chumbar as candidaturas.
  • A Telecinco teve o projecto chumbado porque este não apresentava viabilidade econômica. Segundo a ERC, com base no parecer do CEGE-UNL, a Telecinco não considerou o actual quadro de recessão mundial, utilizando, como base para seus cálculos, dados referentes às receitas dos anos de 2007 e 2008 dos canais generalistas em operação. Além disso, a Telecinco teria ambicionado uma margem de audiência de 20% a 25% no primeiro ano, o que, no entender da ERC, seria de difícil alcance, haja vista que nos primeiros anos a TDT não estaria plenamente apta a ser recebida por toda a população portuguesa. A ERC destacou ainda que a Telecinco considerou o alcance do ambicioso share devido ao carácter inovador da sua programação, mas e empresa não teria entrado em mais detalhes. A Telecinco negou e disse que, conforme prevê o o regulamento do concurso, a Entidade poderia pedir esclarecimentos relativos aos pontos que considerasse nebulosos, o que não foi feito.
  • Com relação aos relatórios económicos, em períodos de crise ou não, eles podem divergir uns dos outros devido às diversas correntes pelas quais se constrói a ciência. Enquanto a Telecinco baseou o seu parecer económico de acordo com um estudo do Professor Dr. Jorge de Sá, a ERC, por sua vez, utilizou o estudo do CEGE-UNL. 
  • A meu ver, se a ERC optou por recorrer a consultores, poderia ter feito isso antes e incluído no caderno de encargos do concurso alguns pré-requisitos básicos inerentes aos cenários económicos e de recursos humanos, já levando em conta o período recessivo e também as projecções para os próximo 15 anos, conforme pedia o regulamento do concurso. 
  • No caso da ZON II, pelo que pude ler dos pareceres da ERC, o projecto realmente seria injustificado, uma vez que previa a realização de 705 minutos de emissão semanal, incluindo 75 minutos de informação diária, com uma equipa de apenas 6 jornalistas. No total, a proposta da Zon previa 59 colaboradores. A empresa também não incluiu meios destinados à produção de conteúdos, que seriam adquiridos de fornecedores externos.
  • A Telecinco anunciou que irá avançar com recursos judiciais, o que poderá paralisar o concurso. Caso o governo opte e consiga iniciar um novo concurso, fica a sugestão para que as eventuais empresas concorrentes peçam pareceres às entidades às quais a ERC conferiu grande parte da justificação de suas deliberações.

Disponibilizo (em pdf) os documentos que consultei:

Deliberação da ERC de 23 de Março de 2009

Deliberação da ERC de 18 de Fevereiro de 2009

Recurso apresentado à ERC pela Telecinco

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